Conseguimos entender (entender, não aceitar) alguns
argumentos que levam o nosso Governo a não se envolver nalgumas efemérides –
neste ano, por exemplo, falamos dos 600 anos da tomada de Ceuta e do 500º
aniversário da morte de Afonso de Albuquerque.
A Sociedade Civil, porém, pode e deve suprir esses
“esquecimentos” oficiais. Este Colóquio*, promovido pelo MIL: Movimento
Internacional Lusófono, em colaboração com a Biblioteca Nacional de Portugal
(BNP), o Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT) e a Sociedade Histórica da
Independência de Portugal (SHIP), é pois um bom exemplo do papel que a nossa
sociedade civil pode e deve desempenhar.
Perguntar-se-á por que o MIL tomou esta iniciativa.
Se fosse sensível aos argumentos mais politicamente correctos, não o deveria ter
feito. Amiúde, o MIL é acusado de ser “neo-colonialista”. Ao promover um
Colóquio sobre uma das figuras maiores da nossa expansão marítima, até parece
que estamos a dar razão a esse tipo de acusações.
Em geral, como Presidente do MIL, nem sequer me dou
ao trabalho de rebatê-las. Talvez de forma ingénua, acredito que qualquer pessoa
minimamente lúcida concluirá que uma acusação como essa é ridícula, não
merecendo por isso qualquer esforço de contra-argumentação. É que a questão não
se põe sobretudo no plano das intenções. Mesmo que, por absurdo, quiséssemos ser
“neo-colonialistas”, haveria um abissal óbice a tal desiderato: nada menos do
que a própria realidade.
E este é o ponto. Alguém acredita que, em pleno
século XXI, um país como Portugal poderia recolonizar qualquer outro país? Só
por delírio. Se defendemos a convergência entre todos os países e regiões do
espaço lusófono – nos planos cultural, social, económico e político – não é
pois, de todo, por imposição de Portugal (ou de qualquer outro país), mas porque
tal desígnio corresponde aos interesses estratégicos de cada um desses países e
regiões. Tal convergência não pode senão cumprir-se numa base de liberdade e
fraternidade.
Dirão alguns que tal convergência deriva de uma
posição completamente idealista, senão mesmo utópica. Diremos, ao invés, que
esta é uma posição maximamente realista: a melhor forma de, realisticamente,
garantir o futuro da língua portuguesa e da(s) cultura(s) lusófona(s) é promover
essa convergência. E isso passa, desde logo, por não fazermos tábua rasa da
nossa história. Não há futuro que se possa erguer sobre o esquecimento ou
escamoteamento do passado, por mais violento que tenha sido. Ao evocarmos,
quinhentos anos depois da sua morte, a figura de Afonso de Albuquerque,
fazemo-lo, pois, nessa perspectiva de futuro. Sem complexos ou
recalcamentos.
* Colóquio “Afonso de Albuquerque, 500 anos depois:
Memória e Materialidade”, Biblioteca Nacional de Portugal/ Palácio da
Independência: 16 e 17 de Dezembro de 2015.
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